NOVO MANIFESTO PELA FEDERALIZAÇÃO DOS CRIMES DE MAIO, E FIM DA "RESISTÊNCIA SEGUIDA DE MORTE"

quarta-feira, junho 27, 2012

COMUNICADO URGENTE DO MOVIMENTO MÃES DE MAIO



Santos, 27 de Junho de 2012

Diante de algumas declarações e insinuações recentes buscando claramente estigmatizar o nosso movimento Mães de Maio, com o patente interesse de criminalizá-lo, nós vimos por meio desta deixar bem claro e reforçado que somos uma Rede de Mães, Familiares e Amigos de Vítimas da Violência com o exclusivo interesse de defender o Direito à Memória, à Verdade e à Justiça referente aos nossos entes queridos vitimados injustamente pela violência de agentes do estado. Superando a dor irreparável da perda fatal de nossos filhos e entes queridos, lutamos cotidianamente pela Verdade e por Justiça em relação a TODAS as vítimas atingidas pelos mais diversos tipos de violações dos Direitos Humanos mais fundamentais, a começar pelo direito à vida e à liberdade de ir e vir em segurança por nossas cidades. 

Não é por outra razão, senão por conta de nossos princípios e práticas cotidianas em busca de justiça e transformação social pela paz, que ao longo desses mais de 6 anos de existência nosso movimento já foi amplamente reconhecido nacional e internacionalmente, por entidades como a Anistia Internacional, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA, a Human Rights Watch, a Clínica de Direitos Humanos da Universidade de Harvard, o Prêmio Nacional 2010 de Direitos Humanos da Secretaria de DH da Presidência da República do Brasil, a Associação de Juízes pela Democracia, o Prêmio Nacional 2011 da Associação Nacional dos Defensores Públicos, o Prêmio Santo Dias 2011 de Direitos Humanos da ALESP, homenagem da Comissão da Anistia do Ministério da Justiça pelo Dia da Mulher em 2012, entre diversas outras manifestações contundentes de reconhecimento e congratulação pelo nosso compromisso incansável com a Verdade, a Justiça e os Direitos Humanos, sobretudo da população mais pobre e vulnerável no Brasil. 

Nada nem ninguém nos desviará desses princípios, desse compromisso e dessa firme trajetória! Tampouco conseguirá, sob nenhuma hipótese, nos estigmatizar fraudulentamente com caracterizações que não nos dizem respeito, em absoluto.

MOVIMENTO MÃES DE MAIO
por Verdade e Justiça, Ontem e Hoje!

segunda-feira, junho 25, 2012

A PARTIR DE HOJE (25/6): SEMANA DECISIVA NA LUTA POR JUSTIÇA E PAZ NA BAIXADA SANTISTA




A partir desta segunda-feira (25/06), às 9:30hs, no Tribunal de Justiça de Santos, o soldado André Aparecido dos Santos, do 6º BPM/I, sentará no banco dos réus neste dia para ser submetido a júri popular em Santos.

Nós do movimento Mães de Maio convidamos a todos nossos militantes, simpatizantes, jornalistas comprometidos com a verdade e a justiça, e demais militantes dos direitos humanos no Brasil a ficarem atentos ao julgamento que ocorrerá a partir desta segunda-feira (25/06), às 09:30hs, no Tribunal de Justiça de Santos. Nós todos precisamos acompanhar passo a passo este julgamento crucial para o combate da violência policial na Baixada Santista, uma das mais violentas do país.

Acusado de nove tentativas de homicídios, um consumado e oito tentados, o soldado André Aparecido dos Santos, do 6º BPM/I, sentará no banco dos réus neste dia para ser submetido a júri popular em Santos. Os crimes se caracterizaram pelo fato de as vítimas terem sido baleadas sem motivo e o atirador dirigir um carro preto. Suspeito de integrar o grupo de extermínio “Os Ninjas”, a devida apuração e merecido julgamento de André Aparecido pode ser a ponta do iceberg que levará ao esclarecimento da persistente violência policial que assola a Baixada Santista desde maio de 2006.

Julgamento longo
Sob os olhares atentos de entidades de defesa dos Direitos Humanos e da sociedade em geral, a sessão começará às 9h30. O juiz Antonio Álvaro Castello a designou para uma segunda-feira porque a expectativa é que possa durar até quatro dias e, desse modo, não há o risco de o julgamento se prolongar ao fim de semana.

Trinta e cinco pessoas foram indicadas como testemunhas: 13 pela acusação, 11 pela defesa e outras 11 comuns a ambas. Algumas delas são protegidas. O depoimento do delegado Luiz Henrique Ribeiro Artacho é um dos mais aguardados em plenário porque ele poderá explicar detalhes da investigação e indícios que recaem sobre o réu.

Recolhido no Presídio Militar Romão Gomes, na Zona Norte de São Paulo, em razão de prisão preventiva, o soldado Aparecido nega os crimes. A defesa tentará colocar em xeque as provas do processo. Testemunhas e vítimas chegaram a reconhecê-lo durante o inquérito policial e em juízo.

Na hipótese de condenação em todos os crimes que lhe são atribuídos, o réu está sujeito a pena de 44 a 190 anos de reclusão. Ele tem 36 anos de idade. A maioria dos delitos ocorreu na madrugada de 10 de abril do ano passado, quando foi cometida uma série de atentados em Santos e São Vicente que teve o saldo de um morto e seis baleados. Porém há diversos elementos para se suspeitar que André Aparecido esteja envolvido em outras mortes violentas na Baixada Santista, ao longo desses últimos anos.

Paulo Roberto: Presente!
A vítima fatal da série de crimes atribuída ao soldado Aparecido é o enfermeiro Paulo Roberto Barnabé, de 34 anos. Na madrugada de 10 de abril de 2011, Barnabé caminhava pela Rua Pindorama, a meia quadra da Praia do Boqueirão, em Santos, quando um carro preto passou devagar ao seu lado e o motorista atirou várias vezes.

O guerrêro Barnabé morreu com um tiro no peito, enquanto seu amigo Arsênio, que estava a poucos metros, foi baleado seis vezes, mas sobreviveu. Posteriormente, na mesma madrugada, outros atentados cometidos em Santos e São Vicente também pelo motorista de um carro preto trouxeram um clima de apreensão e deixou mais cinco feridos.

Álibi derrubado
A câmera de segurança de um edifício da Rua Pindorama registrou o exato momento do crime. A placa e o modelo do carro não aparecem na gravação, mas testemunhas informaram que o veículo é preto, tem os vidros filmados e possui pequeno porte. Aparecido é dono de um Corsa, cujos vidros têm película protetora escura.

Com o passar dos dias, cartazes apócrifos apontando Aparecido como o atirador do carro preto foram colados em postes. Os crimes de 10 de abril começaram a ser apurados pela Delegacia de Investigações Gerais (DIG) e o delegado Artacho reuniu indícios contra o policial militar que embasaram o pedido de sua prisão preventiva.

O réu e as pessoas que ele citou depuseram na DIG e as suas versões foram divergentes. “Entendo que ele tentou encobrir a verdade. A sua esposa também teve a intenção de desviar o rumo das investigações”, disse Artacho. Para o delegado Marcelo Gonçalves da Silva, ocorreram “divergências escandalosas, beirando o falso testemunho”.

Armas e rodas
Quatro dias após os atentados de 10 de abril, o soldado comunicou no 7º DP de Santos o furto de duas pistolas calibres 380 e ponto 40. Segundo ele, as armas foram levadas do seu apartamento, cuja porta teria ficado aberto. O imóvel não apresentava sinais de arrombamento ou qualquer outro vestígio que confirmasse o delito. Tais armas, nós do movimento Mães de Maio suspeitamos que possam estar relacionadas a uma série de outros crimes envolvendo policiais de grupo de extermínios atuantes na Baixada Santista.

Sem as armas do suspeito, a DIG não pôde confrontá-las com cápsulas deflagradas de calibres idênticos recolhidas nos locais dos crimes, prejudicando as investigações. Mas a Polícia Civil apurou que o soldado trocou as rodas de seu Corsa no dia 16 de abril, antes de se apresentar ao comando do 6º BPM/I levando o seu carro.

O soldado passou em uma borracharia, antes de ir ao batalhão, e mandou retirar as rodas pretas comuns que estavam no veículo, idênticas às que aparecem na filmagem da câmera do prédio da Rua Pindorama. No lugar das originais foram colocadas rodas esportivas e ele não fez qualquer menção sobre essa troca ao ser ouvido na PM.

Investigadores da DIG descobriram a borracharia e apreenderam nesse estabelecimento as rodas que estavam no Corsa. Elas foram dadas como parte de pagamento das rodas esportivas colocadas no automóvel. Aparecido ainda pagou um sinal em dinheiro e parcelou o saldo devedor.


PAULO ROBERTO: PRESENTE!
SEM JUSTIÇA NÃO HÁ PAZ NA BAIXADA SANTISTA!

MÃES DE MAIO

quarta-feira, junho 06, 2012

Seis anos depois dos Crimes de Maio, mãe de vítima critica execuções da PM




Já se completaram seis anos do conflito entre a polícia e o Primeiro Comando da Capital (PCC) que matou mais de 600 pessoas. Débora da Silva Maria é mãe de Edson Rogério, assassinado por policiais no dia 15 de maio de 2006. Ela se tornou, depois disso, militante dos direitos humanos. Em entrevista à Carta Maior, Débora conta como é sua batalha ao lado do movimento que ajudou a criar chamado Mães de Maio e sua luta pelo fim das mortes pelo Estado.

Fábio Nassif

São Paulo - A polícia militar brasileira está na mira da ONU. Na semana passada, seu Conselho de Direitos Humanos aprovou várias recomendações como parte do relatório elaborado pelo Grupo de Trabalho sobre o Exame Periódico Universal (EPU) do Brasil. Uma delas é pela extinção da polícia militar. A posição da entidade foi publicada dois dias depois de mais um caso alarmante em São Paulo. Na última segunda-feira (28), policiais militares mataram seis pessoas, segundo eles, suspeitos de tentar resgatar um presidiário membro do Primeiro Comando da Capital. Testemunhas afirmam que houveram execuções e tortura, colocando mais uma vez para toda a sociedade, a urgência do debate entorno da segurança pública. Infelizmente, casos como esse não são esporádicos. A segurança no estado de São Paulo é marcada pela impunidade desses policiais (como apontou matéria recente da Carta Maior).

Os “Crimes de Maio” é um caso emblemático. Já se completaram seis anos do conflito entre a polícia e o Primeiro Comando da Capital (PCC) que matou mais de 600 pessoas. Débora da Silva Maria é mãe de Edson Rogério, assassinado por policiais no dia 15 de maio de 2006. Ela se tornou, depois disso, militante dos direitos humanos. Luta também por memória, verdade e justiça, já que, segundo ela, “vivemos numa ditadura continuada”. Na entrevista abaixo, Débora conta como é sua batalha ao lado do movimento que ajudou a criar chamado Mães de Maio e sua luta pelo fim das mortes praticadas pelo Estado.

Carta Maior - Quantas pessoas foram mortas nos Crimes de Maio?

Na época a Secretaria de Segurança Pública deu uma estatística de 493 mortos. Mas as pesquisas da ONG Conectas deu 532 mortos e a de Harvard ["São Paulo sob achaque", publicado em maio de 2011, pela ONG Justiça Global e pela Clínica Internacional de Direitos Humanos da Universidade de Harvard] deu mais de 600 pessoas. Isso porque há pessoas desaparecidas, o que é de praxe. Descobrimos também que chacinas com mais de uma vítima são registradas como se tivesse uma vítima só. É a maquiagem do Estado em cima das estatísticas.

CM - Você conhece casos de familiares que não tiveram acesso aos corpos?

Sim. Tem a família do Francisco Gomes, pai do Paulo Alexandre, cujo corpo não apareceu até hoje. A gente sabe que são muito mais. É uma prática comum a ação de ocultação de cadáver. O governo do estado liberou naquela época o enterro dos corpos em vala comum. Eles dão uma relação de 19 corpos, mas sabemos que é muito mais. O movimento das mães vem travando uma luta, inclusive pedindo à ministra dos Direitos Humanos Maria do Rosário, fazer com que o governo estadual mostre onde foram enterrados estes corpos. Nós achamos que eles estão espalhados por vários cemitérios. Até o momento, nem a Secretaria de Direitos Humanos deu uma resposta definitiva, e as famílias vivem neste desespero.

CM - Qual a versão que as mães tem sobre os motivos do conflito entre a polícia e o PCC?

Os Crimes de Maio foram a revolta do PCC contra polícia por conta da corrupção. Policiais civis estavam sequestrando familiares de presos e os torturando. E depois do sequestro do enteado do Marcos Camacho, o Marcola, houve uma vingança, segundo o que a mídia divulgou. No relatório “São Paulo sob achaque” vimos que havia corrupção por trás dos Crimes de Maio. Aí se iniciaram as rebeliões como um aviso. Mas nós temos conhecimento que nem todos os crimes cometidos contra agentes do Estado foram praticados pelo crime organizado, e sim pelos próprios companheiros de farda.

CM - Alguém foi punido pelos Crimes de Maio?

Não. Ninguém foi punido. A maioria dos inquéritos foi arquivada. Os que não foram arquivados foram os dos agentes do Estado que indiciaram civis. Temos em aberto só um caso de uma chacina que houve no Jd. Brasil na zona norte de São Paulo. Essa mãe fez as próprias investigações com apoio do Departamento de Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP) e soubemos que em julho vai ter o julgamento pra ver se os cinco policiais serão indiciados pela morte de três rapazes. Essa mãe, apesar de sofrer com o medo, é um exemplo de resistência, e foi a fundo, pois o resto foi arquivado.

CM - Quem arquiva essas investigações?

É o próprio Ministério Público (MP) que pede arquivamento. O fórum do MP da capital parabenizou a eficiência da polícia por sua atuação na época. Deram mais de 60 carimbos de promotores parabenizando a ação. A gente já sabia que os promotores apoiavam o “estabelecimento da ordem”, e, na nossa visão de mãe, eles parabenizaram a matança. Não teria como promotores de outras regiões baterem de frente com o fórum da capital. Não houve vontade do judiciário pra pedir as investigações corretas.

CM - É o caso do seu filho?

No caso do meu filho eu fui atrás pra exigir investigação. Eu queria saber quais viaturas estavam trabalhando na noite daquele dia, nome dos policiais, percurso que eles fizeram, que tipo de armamento eles usavam, quantos cartuchos foram usados. A investigação no MP ficou dentro dessa linha, como eu pedi. Mas a gente viu também que o policial que conduz o boletim de ocorrência mente. E, quando a mãe chega na delegacia dizendo que quem matou o filho dela foram os policiais, eles mudam a própria versão do boletim de ocorrência deles. Ou seja, há várias contradições nessa história que nós não engolimos. Parece que tinha uma ordem para nada ser investigado nem julgado, e a verdade não ser exposta. Eu tenho certeza que se os Crimes de Maio tivessem acarretados em punição não veríamos esta quantidade de jovens mortos nesses seis anos. Deu certo o modus operandi que eles usaram na época e eles usam até hoje.

CM - Como as Mães de Maio começaram a se organizar e se organizam até hoje?

As mães são muito guerreiras. Eu fiquei na cama de hospital porque eu não aceitava a morte de meu filho, e não aceito até hoje. É muito difícil ver um filho trabalhador, honesto - mas eu sempre digo, mesmo que não fosse - pra defender um miserável salario mínimo e a noite ser executado. Não entra na minha cabeça. Caí na depressão no começo. E eu vejo meu filho até o dia de hoje, não é miragem. Eu vi ele me tirar da cama e ele me pegou com tanta força que eu fiquei com a marca dos dedos dele no braço.

Ele falou que me queria ver lutando. Quando ele fez isso eu não deitei mais, só pra dormir mesmo. Fiquei ajudando os outros pacientes e a médica me deu alta. No outro dia fui à caça das outras mães, pois vi a semelhança da causa da morte em vários os casos. Fui atrás da Nalva mãe de um balconista que estava no décimo dia de ferias quando foi assassinado. Falei pra ela: vamos pra luta. Fomos atrás da Vera. Aí ela falou que conhecia alguém próximo da mãe da Ana Paula, a gravida que foi assassinada também.

CM - Receberam algum tipo de apoio?

Batemos em várias portas. Fomos atrás pra provar a boa conduta dos meninos. Um promotor do MP nos disse: a justiça da terra não funciona, só a divina. Todos diziam para tomarmos cuidado com a policia. Mas não aceitamos. Aí fomos eu, Vera e Nalva a São Paulo. Eu nunca tinha ido. Fui pra Ouvidoria da PM, contamos tudo que sabíamos, aí encaminharam a gente pro Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (Condepe). Chegou lá encontramos a Rose Nogueira e o Luiz Dantas, que virou ouvidor da polícia depois. Ela nos deu o livro “Crimes de maio”. E só aí tivemos a noção o que foi o massacre que teve em maio. Só depois de quase um ano percebemos a dimensão do que tinha acontecido, e que não eram só nossos filhos.

Fomos depois pro Conselho Regional de Medicina que fez um levantamento das mortes. Cobramos as autoridades e ninguém nos falou nada. Foi uma decepção. Aí falamos: agora precisamos mostrar a garra e ir à luta. Soubemos que o caso da Ana Paula foi arquivado já em 2006. Ela estava grávida de 9 meses e foi morta junto com o marido. Vimos que os casos foram todos iguais, e que tinha sido a polícia mesmo.

Eu descobri depois que eles estavam preparando a matança dos nossos meninos pelo telefonema que recebi antes do meu filho morrer. Um policial da família disse que era pra eu avisar as pessoas de bem, no dia 15 de maio de manhã, que quem tivesse na rua era inimigo da polícia. Eu nunca imaginaria que a noite matariam meu filho. Eu soube da morte dele pelo rádio, aí liguei pra esse policial, e ele me perguntou na cara de pau quem foi que matou. A gente sabe que funciona assim, quando morre gente, eles vão lá ver. Ele sabia que meu filho tinha morrido e não me avisou.

CM - As mortes foram totalmente aleatórias?

Tudo aleatório. No dia em que ele morreu o rádio disse que tinham 16 corpos no Instituto Médico Legal jogados no chão. Era ano de eleição e o governo tinha que dar uma resposta pro país, mostrando que tinha controle da situação. Ele respondeu à altura, matando nossos filhos.

CM - Qual é o critério que a polícia adota para realizar essas execuções?

É higienização da pobreza. Eles sabem que não dá nada pra eles porque o pobre não tem acesso à justiça. As testemunhas são sempre ameaçadas. Temos uma política de segurança de extermínio. Temos que extirpar essa polícia assassina de São Paulo. O governo do estado de SP não investe no ser humano, só em armamento e viatura. Só pra oprimir, porque segurança que é bom, nada. Nós pagamos a bala que mata nossos filhos, pagamos a arma que mata nossos filhos, os algozes que matam nossos filhos e os mandantes dos crimes dos nossos filhos.

CM - Como agem outros órgãos diante desta situação?

O governo federal está omisso, vendo tantos brasileiros sendo massacrados e exterminados, e não se mete dizendo que o estado tem autonomia. Está tendo um grito do mundo lá fora sobre as execuções sumárias cometidas por agentes do Estado. A ONU gritou já e está gritando desde 2007, condenando essa polícia assassina. E ninguém toma providência. O governo federal diz que o estadual tem autonomia, mas o estadual não pode ter autonomia de declarar a pena de morte da população pobre, negra da periferia. A ditadura não acabou. Só mudou o inimigo do Estado, que não é mais o inimigo político, mas o pobre e o negro. O capitalismo mata na bala, na falta de educação, de saúde e de moradia. A nossa Constituição não vale de nada pro pobre. Este só tem deveres. Direito é só pros ricos.

CM - Semana passada mais 6 pessoas foram mortas pela polícia militar. Como vê o fato de isso estar se repetindo?

Vimos esse caso com repúdio. Mesmo se fosse um resgate de criminosos, a obrigação do Estado era prendê-los. Mas eles fizeram a falsa “resistência seguida de morte”. Ultimamente eles estão perdendo um pouco a linha de acobertamento dos crimes. Só ganham no judiciário. As pessoas estão tendo mais coragem de denunciar. O governo deu uma declaração, como sempre faz, de que está tudo sob controle. Em maio de 2006 também falaram isso. Sob controle foi mandar 150 policias da Rota amedrontar a população.

CM - Acha que há possibilidade de acontecer uma onda semelhante a maio de 2006?

Mataram um policial no Guarujá e a mídia diz que pode ter ligação com as execuções recentes em São Paulo. O governo fala que não existe essa possibilidade, mas nós temos cautela, pois existe sim.

CM - Como você vê o PCC?

Vejo vários jovens sem estrutura nenhuma, vivendo em cadeias desumanas. O PCC foi criado pelo Estado à base de corrupção. E agora a criatura está engolindo o criador. Não vejo eles como organização, e sim como uns desorganizados. Senão estariam fora dos presídios. O verdadeiro crime organizado é o Estado.

CM - O que acha do registro dos homicídios por policiais como “resistência seguida de morte”?

A gente entrou numa campanha pelo fim do registro dessas mortes como “resistência seguida de morte”. É uma prática abusiva pra matar e evitar investigações. Nos Crimes de Maio são 84 com tiros na mão e tiros na nuca, que são sinais de defesa. Isso está no Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3) e nós clamamos que saia do papel. Que seja registrada como homicídio para que tenha investigação.

CM - Você disse que os crimes de hoje ocorrem porque os crimes de maio seguem sem punição. Acha que os crimes de maio ocorreram também pela impunidade dos crimes cometidos pela ditadura militar?

Quem matou na ditadura está nas instituições policiais. Tem torturador que trabalha nas repartições até hoje. Existe uma semelhança muito forte. Temos uma ditadura continuada. Violenta. Contamos cerca de 484 pessoas mortas em 21 anos de ditadura. Nos Crimes de Maio, em uma semana, foram mais de 600 mortes, abafadas pela copa do mundo. Usam as mesmas práticas: desaparecimento forçado, extermínio em massa, encarceramento, tortura nas prisões. Temos que acabar com a militarização, resultado da ditadura. Nós pedimos pro Lula abrir os arquivos da ditadura militar pois precisamos conhecer nossa história, que não é muito diferente do que vivemos agora.


sexta-feira, junho 01, 2012

Convocatória de apoio ao Quilombo Rio dos Macacos




            Companheiras, companheiros, irmãs e irmãos, nós do Núcleo de Negras e Negros Estudantes da UFRB (Núcleo Akofena), viemos por meio desta, solicitar apoio para um caso de execração pública que nosso coletivo vem sofrendo. Compreendemos que boa parte de vocês estejam cientes da briga judicial que estamos enfrentando por conta de uma agressão sofrida por uma de nossas militantes.

            No último dia 15 de maio publicamos em nosso blog uma carta denúncia contando das agressões que sofremos, em especial essa mulher preta do Núcleo Akofena, e que foram praticadas por um jovem estudante da UFRB.

            Entendam o fato com alguns trechos da carta:

“O acontecido se passou na “Cabana do Pai Tomaz”, localizado na praça 25 de Junho, na cidade de Cachoeira, durante a festa de comemoração (no dia 13 de maio) da formatura de dois dos nossos quadros, Clissio Santana e Fred Igor. A confraternização era apenas para convidados, o que não era o caso do sujeito em questão: um jovem branco, classe média, estudante do curso de Ciências Sociais da UFRB chamado Pedro do Livramento. Não bastasse o fato de invadir a festa onde se encontrava parentes e amigos dos dois formandos, o jovem agressor passou a se esfregar em Zilda, fazendo menção de agarrá-la. Diversas vezes Zilda sinalizou ao jovem para que parasse com a ação invasiva e desrespeitosa, configurando-se em crime de agressão física, e tentativa de estupro, segundo a lei 12.015/09, já que a violência tinha por intenção fins sexuais, valendo ressaltar que o ocorrido tem mais de 20 pessoas de testemunhas.

Zilda afastou-se do rapaz, e se juntou a família e aos amigos da festa. O jovem Pedro veio novamente na sua direção, dessa vez gritando-a “É por que eu sou branco que não posso me aproximar?”, e empurrou-a. A partir daí, em um gesto de autodefesa comunitária, desencadeou-se uma briga generalizada por conta desse rapaz que estava em um espaço que não era proposto para ele, uma festa que para as pessoas presentes, representava extrema alegria, superação e vitória.
            Na noite do domingo (13/05), através do facebook, Pedro do Livramento enviou uma mensagem a uma outra jovem, desta vez Tamiz Lima, também militante do Núcleo Akofena, e que também estava presente na festa do dia anterior. Na mensagem, Pedro refere-se a Tamiz como sendo a mulher agredida por ele, diz em todo momento que ela se enganou, e reitera sua preocupação com sua imagem e vida social por conta do ocorrido. A partir daí, podemos levantar mais uma discussão: a homogeneização do corpo negro, desta vez do corpo sexualizado feminino negro, Zilda e Tamiz, além do fato de serem negras não possuem nenhuma outra característica física em comum. Em que estado de embriaguez, ou sob efeito de quais substâncias estava esse jovem que não consegue nem ao menos lembrar qual mulher ele agrediu?”.

            Diante disto, tomamos as medidas judiciais necessárias, o processo já está correndo e já aconteceram duas audiências. Mas ao contrário do que esperávamos a comunidade estudantil da UFRB não nos apoiou, ou apoiou a mulher que foi agredida, pelo contrário, no grupo do CAHL (Centro de Artes Humanidades e Letras da UFRB) no facebook, estamos sendo chamados de fascistas, racistas às avessas, radicais, extremistas, intolerantes, preconceituosos, dentre tantos outros adjetivos.

            Contando com o apoio e a solidariedade dos companheiros e irmãos, que como nós, estão na luta diária contra o racismo, o machismo, a homofobia e as desigualdades de classe. E como nós, compreendem o processo de estigma e criminalização que vem sofrendo os movimentos sociais ao longo da história, gostaríamos de pedir um posicionamento público sobre o assunto em forma de nota ou carta aberta de apoio do referido coletivo. Gostaríamos também de reiterar nosso trabalho contínuo de militância de base na comunidade do Viradouro, periferia de Cachoeira, e nossas contribuições na luta junto a Baixa da Linha (Quilombo situado em Cruz das Almas), à comunidade Ilha de Maré, e ao Quilombo Rio dos Macacos, sempre nos colocando disponíveis para os fronts de batalha de toda e qualquer forma de opressão.

            Certos de que contaremos com o apoio dos companheiros e irmãos, e diante da gravidade da situação, pedimos urgência no posicionamento público, desde já agradecemos.

Nenhuma concessão ao racismo, machismo e homofobia.

Núcleo de Negras e Negros Estudantes da UFRB (Núcleo Akofena)
“Por todos os meios necessários”